quinta-feira, 3 de abril de 2008

Espelhos Celestes




De Theia, a divina e Hypérion, a luz, nasceu Eos, a Aurora.

De Crio e Euríbia (ou de Gaia e do Tártaro), nasceu Astraeus, o alvorecer das estrelas.

Eos unida a Astraeus, teve vários filhos, entre eles:

Phainon, o brilhante.
Phaeton, o claro, luminoso, alegre (também dado como filho de Eos e Cephalus, que não deve ser confundido com o filho de Hélios, o Sol).
Stilbon, o “respingador”.
E Pyoreis, o de cor de fogo, o inflamado.

Eos também se uniu a Cephalus e concebeu a Hésperos, o Oeste, que os romanos chamaram de Vésper.

Os titãs Crio e Euríbia conceberam a Phosphoros, que os romanos chamaram de Eosphoros.




Phophoros, ou Eosphoros, ou Lúcifer




Esse é o mito do nascimento dos planetas, palavra que significa “errante”, pois ao contrário das estrelas “fixas”, eles se movimentam nos céus.

Com a influência dos Persas, os gregos absorveram a astrologia mesopotâmica e associaram os planetas aos deuses. Assim:

Phainon se tornou Cronos, inspirado em Ninurta (Ninib).
Phaeton se tornou Zeus, que assim se sincretizou com Marduk.
Pyroeis torna-se Ares (ou até Héracles), assim associado com o complexo Nergal.
Stilbon se torna sagrado a Hermes, ligado a Nabu (Nebo).

Os gregos aceitaram que Hésperos, o do anoitecer e Phosphoros, o do amanhecer, seriam o mesmo planeta e os consagraram a Afrodite.

De grande importância nesse esquema teve a influencia de Platão, preocupado com o ateísmo. Dizia ele que se os deuses estivessem visíveis nos céus, ninguém poderia duvidar de sua existência. Isso é parte de um enunciado de uma complexa religião sideral, onde as almas que alcançavam a salvação se tornavam estrelas.

Os romanos sincretizaram Cronos com Saturno, Zeus com Júpiter, Ares com Marte, Hermes com Mercúrio e Afrodite com Vênus.

Mais tarde, sistematizada por Ptolomeu (e outros), que foi influenciado pelo aristotélico Alexandre de Afrodisia, vem a astrologia que se torna extremamente popular. Antes, havia o recurso aos oráculos, como o de Delphos, ou o Necromanteion de Ephyra, o oráculo dos mortos.

A astrologia se constituiu em uma tradição, de certa forma questionável. Nergal, deus da guerra, do submundo e da pestilência foi conhecido pelos Hurritas e Hítitas como Aplu. Como sabemos, os hititas influenciaram fortemente a religião grega. Aplu pode ser o antigo nome de Apollo. Embora entremos nos domínios da mitologia comparada, Apollo foi também um deus da pestilência e do submundo, sendo que um de seus animais era o corvo. Os gregos o identificaram fortemente ao Sol, tanto que mais tardiamente tomou lugar ao culto de Hélios em algumas regiões, cada vez mais identificado com o Astro-Rei. Nergal também é algumas vezes identificado com Shamash, o nome acadiano do deus-Sol, que corresponderia ao sumério Utu.

Essa ligação Guerra-Pestilência-Submundo é parte dos elementos tanto solares quanto de Marte. Mas aí estamos atribuindo significados. Dessa forma, consigo influir na fórmula de que Dionísio seria Hades, proposta por Kerényi. Consigo embutir que tanto Apollo quanto Dionísio se encaixam como senhores do submundo.

Significados, significados e significados. Teorias ligadas aos significados.

E é aí que nasce o ponto ao qual quero discutir: Planetas como espelhos. Os céus cheios de significados. Planetas envoltos em diversas especulações, associações, divindades. O sujeito que cria seus objetos e os nomeia. Eventos influenciados pelos observadores.

Toda a teoria de significados planetários pode ser desconstruída e questionada. São corpos celestes que recebem o que queiramos dar. Uma sala de espelhos celeste. A astrologia calcificou seus significados e aplicações em uma tradição. Essa tradição funciona, efetivamente. Mas funciona a partir de quais parâmetros? Essa tradição é tecida pela realidade? Os significados dados aos céus são reais? Ou fazem parte da mente coletiva? Estaremos apenas reverberando pensamentos coletivos? A astrologia é capaz de observar a essência de cada um de nós? Estamos olhando para a Essência, para a Alma, para a mente?

Se estamos reverberando pensamentos coletivos, seriam os comportamentos das pessoas ligados a eles? A astrologia reflete a essência ou a máscara? Os planetas apenas refletem o que vemos, ou impomos o reflexo a partir do que parcamente compreendemos ser? Aquilo que compreendemos ser é o que podemos chamar de Essência?


Sophia



Dentro dessas questões, estamos acessando a Sophia? Existe Sophia na astrologia? Podemos chamar de Astro Sophia? Quando assim o digo, não estou propondo uma astrologia filosófica, pois o filósofo é apenas um amigo, ou assim o pretende ser, de Sophia. Estou falando de contato direto, o acesso, a percepção, os seus influxos. E os produtos do que os filósofos falam, muitas vezes parecem muito distantes de Sophia. Aqueles que dizem ser seus amigos sempre divergem em seus modelos e teorias. E Sophia é apenas e tão somente uma.

Olhando para os planetas como reflexos daquilo que quero significar, tento dar um sentido ao universo tendo como centro de eu mesmo. Posso assim fantasiar, me iludir, criar mundos, com maior ou menor sofisticação “simbólica”, intelectual ou filosófica. Estarei criando um castelo de cartas, todas com diversas significações tarológicas avançadas. Estarei tentando compreender o mundo a partir daquilo que flui de minhas indagações e investigações.

Porém, nada disso parece refletir a minha Essência. Os símbolos são o que são, não o que o declaro que sejam. Observemos primeiro o que são, antes de falar sobre eles e achar o que sejam.

Por muito tempo, advoguei que símbolo não tem significado. Um símbolo aponta. A experiência que temos com o que vem dele é o que conta. Essa experiência vem como um fenômeno. E a percepção parece ser absolutamente subjetiva.

O subjetivo aponta para o sujeito.

O sujeito deve estar ligado para com a sua Essência. Ou o subjetivo será moldado pela mente, por seus jogos e seus caprichos. Ou olharemos para o objeto e vemos o sujeito. O objeto é o objeto e não o sujeito.

Olhar para o espelho dos planetas é refletir o que impomos a eles.

Tornar-se o espelho dos planetas é refletir o que eles são.

Tornar-se o espelho dos espelhos.

O reflexo do reflexo do reflexo. Os reflexos são infinitos.

7 comentários:

Ana Sansão disse...

Olá Marcelo,
Bem-vindo ao time dos blogueiros.
O conteúdo do primeiro post já dá uma idéia do material que vem por aí... Estamos no aguardo de mais!
Grande abraço,
Ana Cláudia

Lia disse...

Hmmmm, afinal o Senhor do Tempo se rende e surge a aurora do seu blog...

Que seja bem vindo à luz.

Beijos!!

Anônimo disse...

Mesmo me deletando do seu orkut eu continuo a buscá-lo, por gostar do que você desenterra no meio da noite... Às vezes, penso que você escreve balançando a cabeça para frente e para trás, como os coribantes incorporavam um deus.

Espelhos Celestes. O prumo da desconstrução criativa, da autoridade de quem se perdeu para se encontrar.

A destruição dos planetas e dos arquétipos, inclusive da própria palavra "arquétipo".

Os planetas como espelhos são os deuses libertos multifacetados que operam as energias de acordo com o que você suporta na carne.

Os deuses são servos da dança, do transe e do extâse, não adianta só pensar, tem que sangrar mesmo. Aguardo mais.

Se puder visita lá o meu também recente blog de poesias delirantes... abraço!

Marcelo Brasil disse...

Ana e Lia,

obrigado pelas boas vindas.

Vamos ver se consigo me dedicar a isso aqui.

Marcelo Brasil disse...

Felipe,

se conseguiu ver desconstrução no meu texto, então esse aí sou eu mesmo.

Derrida se foi. Ainda não li um só livro dele.

Então estou na desconstrução pela desconstrução. Sem teoria ou mestres.

Moranguinho disse...

"Deuses.
Modelados da semente dos tempos?
Personagens nos limbos da percepção?(condição/espaço/onde)
Determinismo inerente à vida? (momento/tempo/quando)
Em que espaços dispõem e limitam
Suas imagens?"

http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=40954467&tid=5206859595409387354&start=1

Unknown disse...

Então,

Nas aulas em que estava acordada na faculdade, ouvi algo sobre nós lermos tudo através de símbolos, e o símbolo simboliza outro símbolo, e assim ad infinitum, sobrando pra gente apenas a alternativa de passar a vida correndo atrás do próprio rabo.

Ou seja, pela própria estrutura do nosso cérebro, não há percepção direta de nada que seja.

Bem, tô só jogando algumas idéias porque estava tendo uma conversa com uma amiga sobre espelhos (tudo é coisa da nossa cabeça) e fatos (existe alguma coisa além da nossa cabeça), e ainda estou intrigada.