quarta-feira, 23 de julho de 2008

E se...


E se me pintasse com a mais fina maquiagem, unido as formas de meu rosto como a de um palhaço? E se fizesse isso para parecer humano? E se trocasse de pintura diante de cada olhar faminto? E se, com minha máscara, mostrasse a sua máscara? Pois olhando para todos, cada um só vê a si.

E se eu soubesse o que esconde? E se a pintura em minha cara fosse a sua perdição? E se, cada traço que desenhei for estampar a sua incompreensão? E se, olhando para minha pintura, perdesse o olhar de tudo e ocorresse o estampar da sua loucura? E se, descobrisse que a sua ordem é aparente? E se, sendo eu um louco palhaço, o fosse só para que pudesse entender pouco mais do que nada, do que não olhou aí dentro?

Que loucura é essa que aparece do nada? É sinal de que me reconhece? Que teme o que vê e chora as lágrimas que nunca darão absolvição? E olhando para si, teme descobrir quem é? Que luta para ser normal nos limites da sua loucura? Que se torna demente tentando encobrir a sua diferença? Que aquilo que chamam de normalidade é uma jaula em um manicômio? Que a sua máscara é uma camisa de força?

E se, olhando para meus olhos alucinados, visse o que existe dentro de si? E se essa alucinação for sua? E se eu souber disso? E se brincar com seus brinquedos, que chama de vida? E se, zombar de seus valores? E se, rir daquilo que chama de responsabilidade? E se, por um mero acaso, ver que minha sátira é certeira?

E se, vendo sua imagem no espelho, ver apenas o palhaço louco? A alucinação de seus gestos, a distorção das imagens que julga verdadeiras? Meu rosto não é meu. Minha face não pode ser vista. O que olha em mim, sua mente não classifica e sua consciência rotula. Minha risada é do que não compreende. Olho a você e nada vejo, só uma caricatura tentando ser séria.

Irei gargalhar de seus trejeitos, que não são seus, apenas imitação. Rirei de suas prioridades, de suas necessidades, de sua mania de ser normal. Rirei de seus rótulos e mais ainda do que pensa a respeito de todos. De suas manias de grandeza, iguais a todos o que querem ser enormes.

Não aceitarei seus valores, nem suas moedas. Nada há para trocar comigo, pois não enxerga em mim o que não pode usar de meu. A pintura não é minha. A máscara não fui eu quem desenhou. A face é você próprio quem estampa.

O palhaço que tanto ri...

Onde está a graça?

Do que ele ri? De forma insana e interminável? Estridente e macabro? Seria, loucura?

Será você a me dizer o que é sanidade?

Qual o motivo de estar tão sério?

Rirei até seus ouvidos doerem. Onde está a piada?

2 comentários:

Marcelo Brasil disse...

Um bom e interessante exemplo de inversão de papéis entre o Rei e o Bobo da Corte é o filme Ran, de Akira Kurosawa.

Inverter e perceber... Quem sabe?

Anônimo disse...

Você é corajoso. Ao mostrar sua face, ao(des)montar sua máscara: quem sou eu que me responde do outro lado de mim?
um abraço